- Um estudo da UCLA revelou que os sintomas de “enjoo matinal”, como náuseas, vômitos e aversões a certos alimentos e odores, estão relacionados à resposta imunológica natural, porém complexa, do corpo durante a gravidez.
- No início da gestação, uma combinação única de respostas inflamatórias acompanhadas de mecanismos comportamentais que os pesquisadores acreditam ser adaptativos, como a náusea, alcançam um delicado equilíbrio, permitindo que a mãe tolere e nutra o feto, que é parcialmente estrangeiro, enquanto evita alimentos potencialmente prejudiciais.
- Esse estudo pode ter implicações no ambiente de trabalho para gestantes, ajudando a ampliar o reconhecimento de que esses sintomas são saudáveis e normais, reduzindo o estigma e abrindo caminho para acomodações práticas no trabalho.
Pesquisadores da UCLA descobriram uma conexão entre os sintomas de “enjoo matinal” e a resposta inflamatória natural, mas complexa, do corpo a mudanças biológicas e corporais durante a gestação.
De acordo com os Institutos Nacionais de Saúde, até 80% das mães grávidas nos primeiros estágios experimentam alguma forma de náusea, vômito e aversões a certos alimentos e cheiros. Embora desconfortáveis, esses sintomas geralmente não indicam que algo está errado com a saúde da mãe ou do feto em desenvolvimento, mas sim que há um equilíbrio delicado típico das mulheres grávidas.
“Durante a gravidez, o sistema imunológico da mãe enfrenta um desafio complicado: precisa proteger tanto a mãe quanto o feto contra infecções, mas sem atacar acidentalmente o feto, cuja identidade genética é parcialmente estrangeira, pois é metade do pai. Normalmente, o sistema imunológico ataca qualquer coisa que pareça estranha, então, na gravidez, ele deve se ajustar cuidadosamente para manter o feto seguro enquanto ainda defende contra infecções,” disse a professora de antropologia da UCLA, Molly Fox.
Fox é a autora correspondente do estudo intitulado “Dos odores e citocinas: Como aversões olfativas e alimentares se relacionam com náusea e imunomodulação no início da gravidez,” recentemente publicado na revista Evolution, Medicine and Public Health.
Os pesquisadores acreditam que esse equilíbrio delicado, que protege mãe e feto, é alcançado por meio de uma mistura única de respostas inflamatórias. Elas funcionam para impedir que o corpo da mãe rejeite o feto, juntamente com mecanismos comportamentais adaptativos, como a náusea, que incentivam a mãe a evitar alimentos potencialmente perigosos, especialmente no primeiro e segundo trimestres, quando o feto é mais vulnerável.
“Náuseas, vômitos ou aversões a alimentos ou cheiros não são indicações de que algo está errado com a mãe ou o feto. É mais provável que sejam sinais de que tudo está progredindo normalmente, e uma reflexão da resposta imunológica saudável e benéfica do corpo,” afirmou o professor de antropologia da UCLA e coautor do artigo, Daniel Fessler.
Metodologia e descobertas
No estudo, a equipe de antropólogos e epidemiologistas liderada pela UCLA coletou e analisou amostras de sangue para medir moléculas do sistema imunológico chamadas citocinas. As citocinas são proteínas que enviam sinais para ajudar o corpo a lançar uma defesa rápida contra doenças e regular a inflamação. Os participantes também responderam a questionários sobre sintomas relacionados ao enjoo matinal e aversões alimentares e olfativas durante os estágios iniciais da gravidez. As participantes foram 58 mulheres latinas na Califórnia do Sul, acompanhadas desde o início da gravidez até o pós-parto.
Cento e sessenta e quatro por cento dos participantes relataram aversões a odores ou alimentos, principalmente em relação a fumaça de cigarro e carne. Sessenta e sete por cento relataram náuseas e 66% experimentaram vômitos.
A equipe do estudo mediu citocinas que promovem a inflamação (pró-inflamatórias) e citocinas que a suprimem (anti-inflamatórias). Eles descobriram que mulheres que apresentaram aversão à fumaça de tabaco mostraram uma mudança notável em direção a uma resposta mais inflamatória. Aversões alimentares, náuseas e vômitos também estavam associados a um equilíbrio imunológico mais pró-inflamatório.
Seleção natural?
A correlação é consistente com a teoria dos pesquisadores de que esses sintomas podem ser parte de uma adaptação evolutiva que ajuda os corpos das mães grávidas a minimizar a exposição a substâncias nocivas, embora os autores do estudo alertem que as evidências não são definitivas e mais pesquisas são necessárias.
Os pesquisadores enfatizaram que o estudo permitiu à equipe observar tanto as respostas biológicas quanto comportamentais humanas durante a gravidez.
“Em muitos mamíferos, o compartimento fetal possui barreiras que o separam do suprimento sanguíneo da mãe, onde estão suas células imunológicas. Mas, em humanos, temos uma configuração única – as células fetais são banhadas em sangue materno. Os humanos possuem a placenta mais invasiva, penetrando profundamente no tecido materno. Portanto, os humanos precisam de estratégias únicas para evitar que o sistema imunológico da mãe ataque o feto,” disse Fox.
Essas mudanças imunológicas podem induzir náuseas, que por sua vez incentivam a evitação de alimentos, atuando como uma camada adicional de proteção, segundo os pesquisadores.
“Hoje em dia, você verá rótulos em embalagens de carne moída ou queijo macio que alertam as mulheres grávidas para cautela com esses produtos devido ao risco de doenças transmitidas por alimentos durante a gravidez. Aversões a certos odores e alimentos, assim como náuseas e até vômitos, parecem ser uma forma de a evolução atingir esse mesmo objetivo,” disse Fessler.
Implicações práticas
Os pesquisadores, incluindo a autora principal Dayoon Kwon, que recentemente obteve seu Ph.D. em epidemiologia na UCLA (e agora é bolsista pós-doutoral em Stanford), afirmaram que o estudo pode ajudar a fortalecer o reconhecimento de que a náusea e o vômito são sintomas normais com bases biológicas associadas a gestações saudáveis. Os resultados do estudo podem ajudar a abrir caminho para acomodações práticas no trabalho, como uma distribuição mais eficiente de benefícios de saúde e outros recursos úteis para reduzir estigmas, ausências excessivas e perda de produtividade.
Eles também encorajam outros pesquisadores a continuar investigando as questões levantadas pelo estudo, não apenas para explorar questões evolutivas, mas também para trabalhar na oferta a clínicos de medidas de prognóstico não invasivas ou de baixo impacto.
O financiamento para este estudo foi fornecido pelo Instituto Nacional de Saúde.